Prática da meditação mediante a identificação da essência da mente

 

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Extrato do livro: LA PRÁTICA DEL ZEN

de Chang Chen-Chi – Tradução do texto p/português, Flávio Capllonch Cardoso

Esta é a meditação “sem esforço” do Zen, e do Mahamudra-Dzogchen. É uma meditação na qual não há nada sobre o que meditar, é o funcionamento espontâneo e maravilhoso da própria mente, o pináculo e a essência dos ensinamentos budistas. Para aqueles que não cruzaram “a porta” esta meditação é a mais árdua, porém para aqueles que a ultrapassaram é a mais fácil de todas. Todos os outros exercícios e práticas não são mais que preparações para esta. O ponto essencial consiste em reconhecer a Natureza da própria mente ou, pelo menos, ter um vislumbre. Se conseguir reconhecer a Essência da Mente, o praticante poderá concentrar-se nela em qualquer lugar ou momento, sem dificuldade. Na atividade e na quietude a consciência do vazio iluminado brilhará sempre dentro dele. Entretanto, mesmo após de haver reconhecido a Essência da Mente, existe um longo caminho para percorrer, o primeiro vislumbre é considerado por todos os budistas algo muito importante e que todo praticante deve procurar realizar antes de tudo. Uma vez transposta a “porta sem abertura”, a meditação já não será uma prática ou um esforço. Converte-se em um ato vital, natural e espontâneo. O praticante pode estar sentado, caminhando, falando ou dormindo; todas as atividades e condições da vida convertem-se em maravilhosas meditações em si mesmas. Não há necessidade de fazer nenhum esforço, e não é necessário trabalhar sobre nenhum objeto ou idéia.
Porém para passar por esta porta é necessário praticar intensamente esta meditação “sem objeto”, seguindo o caminho Zen, o Mahamudra [ou o Ati-Yoga]. […]

A primeira coisa que o praticante da meditação experimenta é o aparecimento contínuo de pensamentos que o distraem. O praticante vê que sua mente é tão ingovernável que nem sequer por um breve período pode controlá-la. Os pensamentos casuais apresentam-se uns atrás dos outros, como uma catarata, sem parar nem um segundo. O principiante acha que os pensamentos divergentes são ainda mais freqüentes que antes: ao invés de diminuí-los, a meditação parece tê-los multiplicado. Muitos principiantes ficam confusos e decepcionados por esta experiência inicial. Sua frustração os leva a duvidar da eficácia da prática da meditação e da possibilidade de obter alguma vez o samadhi.

[…] A verdade é que os pensamentos casuais nunca aumentam por causa da meditação; a meditação apenas nos torna mais conscientes deles. Somente uma mente tranqüila pode tornar-se consciente desse fluxo mental, que até agora fluiu sem ser notado. Portanto, esta experiência é um sintoma de progresso e não de retrocesso. Costuma-se dizer que, se o praticante realizou algum progresso, notará que muitos pensamentos se apresentam e desaparecem dentro de uma fração de segundo. Deste fato se dá conta o próprio Budha no Sutra da Elucidação da Profundidade Oculta*.

A Consciência Alaya (Adana) é muito sutil e muito profunda: nela todas as sementes se agitam como torrentes impetuosas, eu não exponho esta Consciência aos tolos e aos ignorantes, porque temo que agarrem-se a ela, tomando-a pelo Ser Verdadeiro.

De acordo com a filosofia Yogachara, a corrente sempre renovada de pensamentos que se experimenta na meditação é o despertar das “sementes das impressões” [marcas cármicas] que, até o momento, passaram despercebidas no Depósito da Consciência (Alaya). Estas “sementes”, infinitas em número, ilimitadas pelo seu alcance, foram conservadas na consciência Alaya e constituem o material essencial que forma a estrutura básica da mente humana. Todo o reino do samsara está compreendido nesta consciência Alaya e é posto em movimento por estas “sementes”.
O trabalho da meditação consiste, primeiramente, em reconhecer a ação dessas “sementes”, que se manifestam como fluxo mental; em segundo lugar controlar [observar] a atividade descontrolada dessas “sementes” e, finalmente, transformá-las ou auto-liberá-las dentro da infinita capacidade do estado de Budha. Portanto, o praticante não deve desencorajar-se ao descobrir este fluxo mental ingovernável, porém deve continuar a prática da meditação até alcançar o estado de samadhi.

Nota *: Em sânscrito: Sandhi-nirmochasana-Sutra

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